Programa leva alimentos saudáveis do extremo sul ao extremo oeste da cidade

Iniciativa do Projeto Ligue os Pontos, em parceria com a sociedade civil, gera renda a produtores rurais e democratiza acesso a alimentos saudáveis. Famílias de comunidades afastadas do centro recebem, toda semana, cestas com produtos orgânicos, como alface, couve, mandioca e beterraba

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU), por meio do Projeto Ligue os Pontos, iniciou neste mês de outubro um projeto que fortalece o pequeno agricultor que adota práticas mais sustentáveis de produção e ainda leva alimentos mais saudáveis para comunidades periféricas da cidade.

Trata-se de uma ação de CSA (Comunidade que Sustenta a Agricultura), que funciona da seguinte forma: um grupo de consumidores que vive em áreas de maior vulnerabilidade social se compromete a pagar um valor acessível e suficiente para cobrir custos da produção agrícola, de transporte e de assistência técnica de um produtor rural em fase de transição agroecológica de Parelheiros (extremo sul), recebendo semanalmente, em troca e de forma direta, cestas orgânicas com alimentos cultivados por ele.

Desta forma, todos saem ganhando. Tanto o agricultor, que recebe preços mais justos e pode se dedicar de forma livre à sua produção, quanto os consumidores, também chamados de coprodutores, – justamente por esse papel de apoiadores que executam – que recebem alimentos de qualidade, sabendo quem os produz e onde são produzidos.

“O objetivo do programa é apoiar o agricultor em um dos momentos mais significativos da sua trajetória, quando são adotadas práticas que visam à conservação dos recursos naturais e o bem-estar da população. Também busca democratizar o acesso à alimentação saudável, levando produtos orgânicos para locais mais distantes e com maiores índices de vulnerabilidade do município”, afirma Arpad Spalding, da equipe de campo do Projeto Ligue os Pontos.

Até o momento o programa conta com 110 consumidores (coprodutores) da região oeste, entre eles, moradores da COHAB Raposo Tavares, funcionários do Colégio Waldorf Micael e residentes da comunidade Belmont (esses dois últimos localizados no Jardim Boa Vista). Algumas entidades locais da sociedade civil, como o Espaço Cultural Cachoeiras e o Fundo Fica, são parceiros do projeto e ajudam na mobilização de eventuais consumidores, montagem e entrega das cestas e até com recursos para aquisição dos mantimentos.

Com mais de 23 anos de atuação na região da Raposo Tavares, o Espaço Cultural Cachoeiras desempenha desde o início da pandemia de coronavírus um intenso trabalho de segurança alimentar, arrecadando doações de mantimentos para a população mais vulnerável da Cohab Raposo Tavares. Após obter e distribuir mais de 20 toneladas em mantimentos, o grupo presenciou, em setembro, a drástica redução das doações e o programa de CSA emergir como alternativa para minimizar essa questão.

“É uma forma de garantia da segurança alimentar. Os moradores que aderem ao programa pagam e doam ao mesmo tempo para receber alimentos mais saudáveis, uma vez que parte do valor é revertida em doações de cestas para as pessoas mais necessitadas da própria comunidade, escolhidas a partir de uma série de critérios. Além disso, os consumidores recebem instruções de nutricionistas para o preparo de receitas e se comprometem a ajudar na divulgação do programa e montagem das cestas”, afirma Felipe Valentim, integrante do Espaço Cultural Cachoeiras.

A também chamada “cesta verde” do programa de CSA é composta de seis produtos orgânicos: uma folha de salada (alface, rúcula, agrião,…), duas refogas (espinafre, couve, berinjela, escarola…), uma raiz (beterraba, cenoura, mandioca…), um tempero (salsa, cebolinha, coentro, manjericão,…) e uma Planta Alimentícia Não Convencional – PANC (taioba, ora-pro-nobis, azedinha…).

Alimentos, esses, que chegaram através de doação à mesa de Cleusa Aparecida Costa dos Santos, que mora há 31 anos na Cohab Raposo Tavares. Cleusa salienta a importância da entrega das cestas, considerando as dificuldades financeiras que enfrenta, em uma casa onde mora com o irmão, dois filhos e três netos.

“É muito satisfatório receber a cesta com verduras, principalmente pela renda baixa que temos. Na última cesta veio beterraba, chuchu, repolho. Também é muito importante para a minha saúde, pois preciso sempre comer verduras por causa do grau de diabetes que tenho”, destaca Cleusa.

Outro parceiro do Projeto Ligue os Pontos, o Fundo FICA é um fundo imobiliário de propriedade coletiva que compra imóveis no centro de São Paulo e os alugam por um valor não especulativo. Em meio à pandemia, a iniciativa criou um Fundo Emergencial para receber doações e, assim, conseguir apoiar semanalmente projetos e instituições sociais ligadas, principalmente, à moradia, mas também a outros temas relevantes para a cidade, como a agricultura orgânica. Foi justamente aí que entrou o auxílio ao programa de CSA, garantindo a doação de diversas cestas mensais a pessoas em situação de vulnerabilidade.

“Quando fomos surpreendidos pela pandemia, sentimos que precisávamos dar alguma resposta. Nosso foco principal é a moradia, mas também buscamos fomentar a alimentação saudável. Assim, a partir de uma grande doação do Instituto Ibirapitanga, conseguimos apoiar a iniciativa Orgânicas para Todes e esse programa de CSA que vejo com muita potencialidade, pois cada vez mais as pessoas se preocupam com o que está comendo, quer saber de onde veio, quem plantou…É muito bacana o consumidor assumir a responsabilidade pela produção”, comenta Renato Cymbalista, diretor do Fundo Fica.

Nesse sentido, surge o agricultor Rogério dos Santos Oliveira, que está fornecendo alimentos orgânicos, como beterraba, alface, couve e abobrinha, para compor as cestas. Produtor rural convencional há mais de 30 anos em Parelheiros, ele vislumbra no orgânico uma possibilidade de maior renda, mas se esquecer dos impactos positivos para a sociedade.

“É muito gratificante participar de um projeto como esse, levando alimentação saudável para as pessoas. A gente é uma indústria de céu aberto e fundamental para alimentação da população. Eu acredito muito na agricultura”, declara Rogério.

O programa de CSA iniciado neste mês de outubro dá continuidade a um projeto-piloto implantado no Edifício Martinelli, na região central, onde desde março agricultores parceiros do Projeto Ligue os Pontos produzem cestas orgânicas com produtos frescos para serem entregues toda semana a 45 funcionários do prédio.

Projeto Ligue os Pontos
O Projeto Ligue os Pontos, com coordenação da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU), e premiado pelo Mayors Challenge da Bloomberg Philanthropies, busca fortalecer a agricultura na zona sul da cidade para frear a expansão urbana desordenada e proteger áreas ambientais.

A partir do uso da tecnologia como ferramenta de integração e da coordenação de iniciativas existentes e informações da região, seu objetivo é estimular uma economia verde consistente, evitando que as áreas cultiváveis sejam tomadas pela urbanização informal e coloquem em risco a segurança hídrica e ambiental da cidade.

Em suma, a ideia é tornar a produção de alimentos no extremo sul da cidade uma atividade mais sustentável, tanto do ponto de vista ambiental, quanto de renda para os agricultores, e, assim, encorajá-los a permanecer em suas terras e, onde for possível, até mesmo expandir sua produção.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *